
A vida não se reduz à biologia / nem à flor da botânica tampouco à zoologia ou citologia / Contudo se transforma na indústria biológica / que a idéia produz em forma de ciência e filosofia / duas toscas drogas da cultura / engodos para a dor lancinante / a angústia que arruína a vida / que pesa um punhado da terra inteira na existência / ( se a vida é dolorosa, a existência é o símbolo do infinito matemático de dores / que faz do homem o penitente eivado de dores / o homem das dores até o parto inverso da morte ) /
o homem coroado com cardos / ai! para que tantos cardos! / Ó Senhor sem misericórdia de mim! /
Não obstante, a vida do outro ser humano / daquele outro ser plasmado no plasma da empatia / belo, talentoso, genial, poderoso, famoso e rico / parece ser sempre uma vida feliz / porque lavada no mel da idealização / Vida lavada pelo mel ideal / pela idéia que floresce na mente humana / - a idéia : algo puramente longe da realidade / sobre a naturalidade entre a lua clara do nascimento / e a morte negra enrodilhada na alma morta / envenenada pelo líquido amniótico presente na cor da noite incolor / ( um rio negro de mambas líquidas que deságuam na noite / no manto inconsútil e na mantilha negra / aberta na boca venenosa e ameaçadora da mamba negra / escondida nos vestidos das noites / entre flores soprando trombetas de perfumes peçonhentos / no paraíso conservado na mais mínima expressão da flora ) /
Quão bela a vida da alteridade existente na mente! / na mamba negra torcida em forma de mente humana / - árvore do conhecimento da vida e morte / do veneno e do remédio / do pharmacón no sumo das ervas pisadas / e na peçonha da taipan que se arrasta entre as raízes das selvas australianas / do outro lado do mar emaranhada ) / Porém na realidade fluída dos minerais / ( realidade é atualidade: coisa ligada ao tempo que flui na corrente de energia e aos sentidos pescadores do ser humano / e do animal ou vegetal cuja vida funciona ao sol e à lua sob galáxias chiantes / estridentes grilos nas dobras da sotaina da noite ) / - na realidade esculpida a dedo de tempo na areia do corpo sofredor / pois a vida é dolorosa para todos os seres vivos / mormente para os míseros humanos / nos quais a vida se modifica pouco e pouco em existência / monstro maior que o leviatã agitando mares / cruz que pesa demais / verga o corpo e a mente antes das cãs / apesar das drogas mentais produzidas pelas doutrinas / tentar em vão mitigar essa solidão em alqueires de terras desabitadas / (sem sequer um eremita meditabundo na cova de santo Antão) / no remédio que espalha a solidão em cinzas nos cinzeiros / ou água na cerveja e na vodca / ( A existência é um inferno que nasce dentro da mente / uma via sacra em brasas vivas / um cadinho onde se tortura o santo e o sábio / o ermitão Santo Antão penitente no deserto : / o Santo Antão extraído como filho do meu coração! ) /
Santo Antão do Deserto | |
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Antão do Deserto, por Zurbarán |
Ao aprender submissão em língua e cultura / o ser letal que nos anima por dentro / a triste alma de Deus / é regurgitado para fora do ser / e começa a existir paulatinamente / peregrinamente se inicia na existência ao sair do casulo, crisálida, / ganhando mundo e dor intensa a cada passo / até chegar ao auge de ser um sábio : / sábio vegetativo como o poeta ou o filósofo / possuidor da inteligência plena da vida e da razão / ou um sábio social como o cientista ou o engenheiro / cuja inteligência animal chegou ao ápice / ( A poesia e a filosofia é inteligência exclusivamente humana / suprema sabedoria humana a que não tem acesso os animais / nem tampouco a maioria dos seres humanos /
Todavia a ciência e a tecnologia é inteligência animal / que visa somente à sobrevivência e ao poder territorial / e está submetida aos conceitos da filosofia e à sensibilidade do poeta / quando se torna supremo saber ao se manifestar na inteligência animal do homem / graças ao tempero filosófico e poético / que a transforma numa ciência maior do que a possui os outros animais ) / Existir é sair ao mundo / afrontando a dor e os perigos / até que venha o veneno da morte / é parir o ser / dar à luz ao ser / pô-lo no mundo fora do ovo de ouro do pensamento / É sair ao mundo carregando o peso da inteligência às costas / deixando pensamentos e sentimentos sob a forma de alienações / expressas no comportamento e posição dos filósofos cínicos / dos frades franciscanos e beneditinos / que exprimem a existência de alguns homens / que pensaram e agiram no mundo / que inventaram o motor Otto de combustão interna / ou um ritual, uma ética, uma maneira de pensar ou agir / um posicionamento do ser invisível dentro do pensamento e for do mundo / para um ser em práxis fora do pensamento e dentro do mundo natural / ser para a vida e para a morte dentro e fora do pensamento / no mundo ou na mente e em ambos simultâneamente / lançando ao peso da vida a gravidade da existência / como o fizeram os filósofos cínicos que depois forma os cristãos / um dia foram os filósofos existencialistas engajados / e por fim os "hippies" / que como os cristãos arremedaram o comportamento ética da inteligência do filósofo cínico / os primeiros sábios a existir no mundo e não somente serm no pensamento / os primeiros a manifestar a inteligência poética / inteligência primeva e primeira a que pode aceder o homem inteligente / que num último esforço evolutivo humano pode chegar à inteligência da filosofia / último estágio da evolução da inteligência puramente humana /
São as duas supremas e únicas inteligências humanas / A junção de ambas num só homem leva à plena sabedoria / A existência sem o movimento dialético do pensamento / termina em simples alienação do pensamento / que se transforma em instituições / e faz nascer a religião e outras formas carregadas da prática do mercado / que vieram da embriaguês das idéias / e passaram a existir como delírio social cultuado na forma ideal das instituições / ( as idéias alienadas em instituições fazem crer que tudo é perfeito / que nada muda nunca e está fora da natureza / protegido no reino sobrenatural das idéias / um reino que não é nem existe neste mundo / mas faz as pessoas terem fé nas idéias / que chamam de Deus, Jesus, amor, dentre outros conceitos / sobrenaturalizados graças ao poder de produzir ilusão das idéias / transmutadas em doutrinas e ciências ) /
A existência real, fáctica, natural, cultural e política / é antes de tudo práxis / transformação crítica da realidade alienada / em realidade realizada pela crítica / que faz retornar a alienação ao pensamento como ente, entidade, / que se paralisa e funda na pedra da realidade mineral / e não tem o movimento vivo do pensamento no ser humano / que pode analisar e inovar o que caduca na rocha sobre a qual se levantam asilos / que tomam o lugar do homem na rigidez dos conceitos cimentados /
Somente o filósofo e o poeta tem o poder de colocá-la de novo no fluxo existencial / até que o produto do pensamento se aliene outra vez / na degradação cotidiana / e possa retornar ao espírito humano que a faz girar na crítica dialética / único pharmacón para a alienação perene / daquilo que vai ao mundo / e invade o espírito acanhado da maioria dos homens / que têm o bicho preguiça arrastando-se no pensamento / e por isso vendem, alienam seu pensamento / comprando doutrinas que faça seu espírito parecer que pensa / adornando-se com sofismas e erudições de memória / alienadas nas instituições / que vendem o saber como o fazia o sofista na Grécia Antiga /
O espírito roto de epitáfio sem rota / afoga a existência no álcool ou na filosofia do existencialismo / na profissão, na ilusão do amor sexual / ( o amor é sempre exercício sexual ) / ou suicida-se nas águas profundas da hipocrisia / o que é pior que uma morte por coma alcoólica / pois a hipocrisia é um coma em longos anos / com morte cerebral quase imediata / ( o ser social é esse Frankenstein / morto pela estupidez / que é a forma de morte cerebral e comatosa em vida ) /
A existência se caracteriza pela saída de si para o mundo / sair de dentro do ovo banhado de si / que é mais que estar banhado de ouro puro / em meio a bandos de criminosos sequiosos por uma vítima / ( Existir é sair em batalha por si contra os reis deste mundo / solitário solitário enfrentando legiões de sicários venais a soldo desses reis / que são as verdadeiras bestas do Apocalipse / anunciadas nos oráculos pela poesia filosófica vegetal dos profetas / que sabem da alma deles desde antes de saltar das ervas na vida / ligando os pensamentos e sensibilidade do sistema nervoso vegetativo / que guardam toda a sabedoria natural de bilhões de anos em estrelas / à razão fria e sensibilidade aprendida / pelo sistema nervoso central / que os seres humanos comuns usam como se fosse o único sistema de pensamento ) /
Por fim um dia quiçá ressuscitaremos na primavera / aos pés da flor azul que pensa em silêncio e sem idéias / sobre a flor de lótus de Buda / a filosofia vital e não biológica dos filósofos cínicos /
Diógenes, de John William Waterhouse, mostrando sua lâmpada, seu barril e as cebolas das quais ele se nutria.
cidades e lagares /
em companhia eremita das ervas que trançam os caminhos /
moldam as palmilhas onde se planta o pé /
e faz emergir o ermitão /
que é o homem em sua verdade, santidade, sabedoria, inteligência, serenidade, divindade... /
MONTANHAS ROCHOSAS, MONTANHAS ROCHOSAS
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